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Entrevista: Daniel Moraes, diretor da ABII

Tempo de Leitura: 10 minutos

Daniel Moraes é um executivo com 20 anos de experiência em inovação, tecnologia, transformação digital e ecossistema de startups. Ele assumiu no último mês uma das vagas de diretor da Associação Brasileira de Internet Industrial (ABII). Sua carreira foi desenvolvida nos segmentos da indústria de cimento, alumínio, eletro-eletrônico, mineração e setor elétrico, com passagem significativa nas empresas Tupy, Norsk Hydro, Embraco, Votorantim Cimentos e Inepar. Daniel é graduado em engenharia industrial elétrica, administração de empresas e tem MBA em gestão estratégica de negócios.

Esta entrevista é uma continuidade da série iniciada em 2020, com líderes e diretores da ABII. É uma forma de inspirar e estimular a participação neste movimento de transformação que a associação promove. A ABII completa cinco anos de fundação em agosto de 2021 e atua com o objetivo de promover o crescimento e o fortalecimento da indústria 4.0 e da IIoT (Industrial Internet of Things) no Brasil.

Boa leitura!

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Qual é a sua formação profissional e como ela te trouxe até aqui?

Daniel – Eu entrei muito novo no meu primeiro curso de graduação, sou formado em Engenharia Industrial Elétrica com ênfase em eletrotécnica pela UTFPR (antigo CEFET-PR). Costumo dizer que fiz dois cursos ao mesmo tempo, o de formação e um segundo que foi sobre realidade. Comento isso pois cresci no interior do Paraná e me mudei para Curitiba para cursar uma universidade federal onde encontrei uma turma já toda formada com cursos técnicos e trabalhando em boas empresas. O ritmo era outro. Após a minha formatura da engenharia, percebi que eu precisava aprender mais sobre gestão, finanças e pessoas; por esta razão decidi fazer uma segunda graduação em Administração pela Univille. Como complemento, realizei uma pós-graduação por meio de um MBA em Gestão Estratégica de Negócios pela PUC-PR/Católica-SC. A pós me ajudou a entender sobre novos modelos de negócios, o que foi algo importante para a minha trajetória profissional. Normalmente, o mercado ao longo da nossa jornada vai nos moldando entre generalistas e especialistas, no meu caso, desde muito cedo percebi que eu queria seguir um movimento em “T”, generalista em várias áreas com uma certa amplitude de assuntos, mas conforme as oportunidades foram ocorrendo, fui me tornando também especialista em algumas áreas de interesse. Hoje percebo que essa visão me permite navegar por vários assuntos e quando necessário entrar com profundidade na mesma variedade de tópicos.

Você continua estudando? Como o estudo se encaixa na sua rotina atual?

Daniel – A minha forma de aprendizado mudou muito nos últimos anos, tenho investido muito mais tempo em experiências, em conversar com pessoas de visões, culturas, histórias e conhecimentos diferentes do meus. Sempre que tenho oportunidade, busco conversar para entender um pouco sobre o que a pessoa faz, quais são seus desafios e suas realizações; aprendo muito com essas informações. Outra fonte de conhecimento tem sido estudar outros segmentos e empresas: entender o que estão fazendo, ler os vários relatórios públicos (em especial os de sustentabilidade) e gosto muito de voltar no passado e verificar como as empresas que anunciaram estratégias e ações cinco anos atrás realmente executaram as mesmas e em qual estágio estão hoje. Deu certo? Deu errado? Também uso muito o “learning-by-doing”, aprender fazendo. Me permito sair da zona de segurança com muita frequência e talvez esse tenha sido o principal catalizador de aprendizado que tive nos últimos anos.

Me conte um pouco sobre sua trajetória profissional? Como foi o início e como é hoje, muito diferente?

Daniel – Comecei minha jornada profissional dentro da universidade, conforme comentei, boa parte da minha turma de graduação tinha cursos técnicos prévios e por esta razão não sobravam muitos estágios para um aluno sem experiência. Percebi que outros alunos tinham o mesmo problema e resolvemos empreender, abrimos uma empresa de equipamentos biomédicos focada em fisioterapia, desenvolvemos o protótipo do nosso primeiro produto, ganhamos vários prêmios de inovação, geramos um pedido de patente e fechamos a empresa para ir fazer estágio. Sim, hoje me dou conta que erámos uma startup, porém no meio dos anos 1990 esse conceito não era claro e faltou uma boa mentoria indicando que o caminho de inovar como empreendedor seria uma alternativa. Após esse episódio, construí uma carreira clássica (estagiário, trainee, engenheiro etc.), porém passei por várias áreas diferentes. Comecei no segmento de desenvolvimento de produtos para o setor elétrico de média e alta potência, fui trainee em uma empresa do ramo industrial com o foco em desenvolvimento de projetos industriais com responsabilidade em automação, eletrotécnica e comissionamento, fiquei 6 anos atuando com P&D de controles eletrônicos até que então mergulhei no mundo de inovação e novos negócios. Essa etapa me permitiu trabalhar em novos modelos de negócios com base em econômica circular e Internet das Coisas, experiência que abriram as portas para uma posição em transformação digital no setor de mineração. Atualmente faço parte do time da Tupy como responsável por Transformação Digital e Inovação na Tupy UP, muito feliz pela oportunidade e desafio de utilizar todas as competências e conhecimentos acumulados ao longo da minha jornada em uma organização que está em um excelente momento e como protagonista do seu próprio futuro.

Qual foi o momento de maior aprendizado profissional que você teve?

Daniel – Eu acredito que não foi apenas um momento e sim vários. Inclusive, se você me permite compartilhar uma reflexão, na verdade é uma dinâmica de aprendizado constante. Todas as vezes que fiz trabalhos e projetos totalmente fora da minha zona de conforto, foram momentos de muito aprendizado profissional. Eu tenho um lema que uso constantemente nas minhas reflexões, quando estamos em uma situação de zona de conforto, na verdade é uma situação de muito risco. Comento isso por que nesse mundo de constantes evoluções e em que todo dia recebemos uma nova tecnologia, desafio, mudanças… o profissional precisar estar sempre em uma dinâmica de movimento e se permitir a fazer algo novo é um excelente começo.

“Todas as vezes que fiz trabalhos e projetos totalmente fora da minha zona de conforto, foram momentos de muito aprendizado profissional. Eu tenho um lema que uso constantemente nas minhas reflexões, quando estamos em uma situação de zona de conforto, na verdade é uma situação de muito risco.”

Teve alguma oportunidade que você deixou passar e se arrepende? Ou ao contrário, teve uma oportunidade que você abraçou e só depois percebeu o quanto ela mudou o roteiro da sua vida?

Daniel – Para mim, uma vez que você toma uma decisão só resta um caminho: para frente. Não costumo olhar para o passado e pensar como teria sido caso a decisão fosse outra. Um pouco disso vem do entendimento que toda decisão irá sempre ter ônus e bônus, sendo uma escolha onde cabe a nós analisarmos da melhor forma, usando nossos valores, qual será a melhor alternativa. Um bom exemplo foi o de ter passado os últimos três anos morando em Belém do Pará. Em nenhum momento parei para pensar e se eu não tivesse ido… E hoje quando conversamos em família, foi uma experiência espetacular para todos, temos apenas bons aprendizados, boas lembranças e muitos bons amigos desse período.

Uma dica para um jovem que está iniciando sua jornada profissional:

Daniel – Priorizar no começo da sua carreira oportunidades que permitam você aprender e ter experiências, busque mentores que possam lhe ajudar a entender como navegar de forma produtiva, busque por ambiente com diversidade de pensamento e liberdade para debater e, principalmente, invista seu tempo livre em atividades que possam ao mesmo tempo serem divertidas, mas que contribuam de alguma forma para seu aprendizado e desenvolvimento pessoal. Uma situação que ocorreu comigo no começo da minha carreira e que hoje eu vejo que fez muita diferença. Eu troquei uma oportunidade de emprego em uma indústria, por um estágio não remunerado de dois meses na usina hidrelétrica de Itaipu. Hoje, para mim essa experiência em Itaipu foi o momento onde a engenharia “fechou na minha cabeça”, onde eu entendi o papel do engenheiro, quais áreas eu gostaria de trabalhar e em quais áreas eu não gostaria de atuar, o quão grande o resultado do nosso trabalho pode ser. Essa experiência mudou meu autoconhecimento como profissional e pessoa.

Liderança, inovação, empreendedorismo são fundamentais? Todos precisam desenvolver competências relacionadas?

Daniel – Excelente pergunta. No meu ponto de vista podemos separar essa discussão em duas partes: competências e proficiência. Competência: com toda certeza quem possui competências de liderança, inovação e empreendedorismo, tem um diferencial em qualquer área de atuação. Eu apenas complementaria com mais uma competência que vai ser cada vez mais importante, conhecer de pessoas. Proficiência: aqui é o ponto chave dessa questão, não precisamos ser super especialistas em todas essas competências. O grau de profundidade que precisamos conhecer essas competências, varia em relação a sua área de atuação, seu papel, sua profissão e seus interesses. A dica que eu gostaria de compartilhar é em vez de tentar ser 100% em tudo, procure entender qual é o mapa de competências necessário para você hoje e no futuro (pensando principalmente em proficiência). E aos poucos desenvolva de forma estratégica e estruturada a sua jornada.

Como você chegou a ABII e se tornou um dos diretores? Qual a sua relação com a associação?

Daniel – Meu primeiro contato com a ABII foi em 2017, eu atuava em uma empresa que era associada e estava a frente de uma novo negócio focado na prestação de serviços para empresas de bebidas e sorvetes, via uma plataforma de soluções que tinha como topologia tecnológica o uso de IoT (Internet of Things) embarcado e freezers e geladeiras em pontos comerciais. E nessa época surgiu a oportunidade de inscrever nossa inciativa no prêmio ABII, o qual fomos vencedores daquele ano. Desse episódio, saiu uma série de bons contatos com excelentes profissionais, os quais mantive em minha rede de relacionamentos. Em 2018 assumi um novo desafio em outra empresa e Estado, onde não pude mais ter participação ativa na ABII, mas continuei trocando informações, discutindo conceitos, compartilhando boas práticas com vários integrantes da associação. Em 2020 retornei para Santa Catarina na Tupy e fez todo o sentido ter a associação na ABII como ação de potencializar nossas pessoas e nossa adoção da indústria 4.0, e nesse processo acabei sendo convidado para compor a diretoria da ABII.

Qual a importância da ABII no atual contexto do país?

Daniel – Neste ano, estamos comemorando 10 anos da definição do conceito da indústria 4.0. Porém, quando trazemos esse conceito para um paralelo dentro da nossa realidade no Brasil, é fácil perceber que ainda temos muito o que evoluir na jornada de desenvolvimento e adoção. No meu ponto de vista a ABII tem o importante papel de ser o “farol” nesse oceano de possibilidades. Já tive a oportunidade de conversar com vários executivos de empresas em diferentes tamanhos e setores, e pude perceber que na discussão estratégica o começo da jornada da indústria 4.0 é algo muito cheio de dúvidas e confuso. Algumas dúvidas que surgem: devo investir em infraestrutura digital? O que é cibersegurança e como isso me afeta? Posso colocar sensores? Por que eu vou fazer esse movimento? Terei retorno de curto prazo? Mas isso não é a automação? A TI implementa tecnologias na fábrica? Como gero valor? E por que pessoas são importantes? Estar na ABII e participar dos vários grupos de trabalho, acessar o ecossistema digital da ABII com várias outras empresas abertas para colaborar e discutir temas relevantes da jornada digital de forma colaborativa, é algo que faz toda a diferença e permite a qualquer organização encontrar o caminho mais curto e de menor risco nesse mar de tecnologia.

Especificamente neste momento, que ainda estamos enfrentando a pandemia mundial, qual o papel da tecnologia?

Daniel – Eu tenho uma premissa pessoal que em qualquer momento o papel da tecnologia tem que ser positivo para as organizações, pessoas, sociedade e meio ambiente. Muito mais do que migrar as pessoas para o trabalho remoto (que foi a forma como o papel da tecnologia possa ter sido percebido em um primeiro momento), eu acredito que o grande mérito da tecnologia foi outro. Estamos passando por uma fase de incertezas, em que as pessoas tiveram de mudar o seu modo de interagir e conviver; no meu ponto de vista a maior realização da tecnologia foi a possibilidade de nos reorganizarmos e adaptarmos, por meio da utilização das suas possibilidades. Cada pessoa teve e tem uma necessidade diferente ao longo da pandemia. Pessoas precisaram buscar novas formas de renda, outros trabalhar remotamente, pessoas precisaram manter o contato com os parentes isolados, comprar coisas e alimentos com segurança, tirar dúvidas sobre um momento de incerteza, ter acesso a medicina, falar com alguém em momentos de maior angustia, continuar aprendendo ou ensinando etc. Em todas as necessidades, a tecnologia esteve presente como parte da solução.

“Sem as pessoas não temos a adoção das tecnologias e soluções e sem essa adoção o pior tipo de falha ocorre: as empresas realizam investimentos, porém os resultados não são gerados por que as pessoas não usam as tecnologias. Organizações com uma cultura digital bem definida, são as que conseguem construir os melhores resultados pela aplicação das ferramentas digitais.”

Você acredita que vamos para um outro patamar de utilização das tecnologias da indústria 4.0 após a pandemia?

Daniel – Acredito que esse movimento começou muito antes da pandemia, porém empresas com maior nível de adoção da indústria 4.0 tiveram maior capacidade de adaptabilidade. Acredito que o pós-pandemia irá acelerar muito mais a utilização, pois teremos um período de reorganização e retomada econômica, de revisão das cadeias produtivas e dos processos. Esta fase pós-pandemia irá necessitar de agilidade, competitividade e novamente rápida capacidade de adaptação; e nesses quesitos a indústria 4.0 é uma das alavancas mais importantes.

Qual a importância das pessoas na transformação digital?

Daniel – Para mim, Digital são as várias tecnologias disponíveis e Transformação é 100% sobre pessoas. Sem as pessoas não temos a adoção das tecnologias e soluções e sem essa adoção o pior tipo de falha ocorre: as empresas realizam investimentos, porém os resultados não são gerados por que as pessoas não usam as tecnologias. São as pessoas que definem como a tecnologia será utilizada, onde e por que; são as pessoas que vão interagir com essa tecnologia lado a lado nos processos e são as pessoas que vão colher os benefícios dessa aplicação. Organizações com uma cultura digital bem definida, são as que conseguem construir os melhores resultados pela aplicação das ferramentas digitais.

Quem é seu guru, sua grande inspiração na vida? O que aprendeu?

Daniel – Boa questão. Confesso que nunca pensei sobre este ponto. Fazendo uma reflexão rápida, acredito que a minha inspiração vem de várias referências que pude coletar ao longo da vida, onde aos poucos pude ir entendendo o que de melhor eu poderia aprender (e ainda aprendo) com essas pessoas. Quando criança, eu passei 12 anos dentro do movimento escoteiro. Muito da minha forma de ser, interagir, colaborar e estilo de liderança, veio de referências dessa época. Estudar em uma universidade federal, me permitiu entender muito sobre um ambiente onde eu não consigo controlar as coisas, que a necessidade de adaptação e aprender a falhar é importante. Muito dos meus colegas de turma me deram os melhores exemplos que eu poderia ter naquele período. Experiência nas empresas, eu tive contato com muitos profissionais espetaculares, em todas as áreas e níveis. Também tive exemplos muito ruins, mas que me ensinaram como não ser e o que não fazer. Núcleo familiar, meus pais (valores e referências), esposa (tenho formação técnica e minha esposa possui formação em humanas, desta colisão acredito que saem os meus maiores ajustes de rota) e filha (ela tem 10 anos e me vejo tendo que olhar para as gerações mais novas e aprender como eles estão se desenvolvendo dentro de um mundo muito mais tecnológico). Interagir com culturas diferentes, pois já tive a oportunidade de morar no norte, sul e nordeste do Brasil. Cada oportunidade de conversar com as pessoas gerou um mar de aprendizados, destaco aqui que aprendi que ainda perdemos tempo com conflitos por diferenças em vez de investirmos em criar igualdades. E como inspiração na vida, é a de ter a tranquilidade que todos os dias dei o meu melhor, na linha de construir as coisas que eu acredito e que possam fazer a diferença para as pessoas e ambiente.

Indique um livro (ou um filme, ou uma série, ou um site, ou um canal) que seja inspirador:

Daniel – Passamos ultimamente muito tempo isolados e com livros, filmes, séries etc. A minha sugestão é um pouco diferente, mas dentro da medida do possível devido este momento de pandemia que estamos passando: se permita a fazer algo diferente. Pense em algo que você nunca fez, que te dá frio na barriga e realize!

Sobre a ABII

A Associação Brasileira de Internet Industrial (ABII), fundada em agosto de 2016, atua com o objetivo de promover o crescimento e o fortalecimento da indústria 4.0 e da IIoT (Industrial Internet of Things) no Brasil. Fomenta o debate entre setores privado, público e acadêmico, a colaboração e o intercâmbio tecnológico e de negócios com associações, empresas e instituições internacionais, a partir do desenvolvimento de tecnologias e inovação. A ABII é signatária do Acordo de Cooperação com o IIC (Industrial Internet Consortium), consórcio criado em 2014, nos Estados Unidos, com o mesmo fim, pela IBM, GE e Intel. Buscando inserir o Brasil nesta revolução, Pollux, Fiesc/Ciesc e Nidec GA (empresa detentora da marca Embraco) uniram-se para fundar a ABII.

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